quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Glutinum mundi


Beatriz Vargas Ramos

Posso gritar no meio da praça que dá igual...
Ninguém me ouve, mas eu acabo de dar meu voto para eleger presidente, governador, deputado, senador.
Na era da comunicação, não consigo comunicar aquilo que não é comunicável contra aquilo que, sim, é comunicável.
Há comunicação possível contra a comunicação de massa? Toda comunicação se perde na massa, sem seleção? O mercado já elegeu o que é comunicável. Será que sou minoria (grupo que, sozinho, é menor que a metade do grupo inteiro)?
O sentimento é de imobilidade, de incapacidade de ação.
(Eu sou um inseto asqueroso do qual ninguém se aproxima, não posso me mexer porque estou de pernas para o ar, mas ainda assim posso falar, posso aparecer, mesmo que por alguns minutos numa das quatro telas dessa realidade assumidamente ficcional do presente...)
Tudo pode aparecer, pode ser visto, mostrado, exibido e, na sequência, engolido, engolfado pela massa de informação, retornando à inércia, à posição inicial.
Nada acontece se alguém tenta mudar alguma coisa.
Qualquer modificação é passageira e se derrete, se deforma e tudo retoma a ordem natural do universo.
Todos continuam comprando e consumindo.
(Quando eu morri, já velha e ainda jovem, não precisava mais de nada disso, depois voltei na pele de outras jovens velhas, insetos iguais a mim. Eu não sou boa nem bonita e é essa minha vingança. Tão limpinhos eles são, que eu passei a amar a sujeira).