sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Idade & Realidade

  
Eu vivo no Século XXI e nele vou morrer.
Muitos anos já se passaram do “tempo que sobre a terra me foi concedido” 
E não me inscrevi em lugar nenhum... nada plantei, nada semeei.
A finitude me atormenta: não assistirei à pane da “grande máquina”.

Meu País já participa de “um, vírgula alguma coisa por cento” 
do comércio mundial e, pelos cálculos de especialistas, 
chegará ao nível socioeconômico dos países ditos desenvolvidos.
Em 350 anos.
Os especialistas não disseram que mundo vai sobrar para consumo
dos atuais excluídos do mercado tecnológico.
O planeta não aguenta mais 350 anos de Halliburton...
Não haverá mais ar condicionado em 350 anos.
Em 350 anos não haverá monstruosas geleiras na Patagônia.

Leio jornal.
Pela TV eu vi a guerra gringa devastar o Iraque,
- A guerra é sem fim... –
Sou cidadã espectadora.
A globalização não me trouxe felicidade.
Faço análise e tenho depressão
- com quem será que meu analista faz análise? –
Estou envelhecendo.
A velhice nos torna invisíveis e sem dentes,
a memória falha.
Refaço todas as manhãs o mesmo caminho,
Repito todos os dias a mesma tarefa de Sísifo.
Mas ainda tenho alguns poucos e insignificantes prazeres,
como cuspir em frente à Embaixada dos Estados Unidos.

Sinto saudades da velha árvore onde minha infância dormia.





quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O Q U E F A Z E M O S N O M U N D O ...

Beatriz Vargas Ramos

Cada dia é feito de infinitas possibilidades,
De uma profusão de “milagres” a cada instante,
A cada fração de tempo a vida se revela,
Exuberante!

Porque tudo traz em si o seu contrário,
O seu avesso, o seu reverso,
Uma vida chega ao fim,
E, simultânea,
Outra aparece.

Lá onde o fim
Apenas o começo.

Porque nada é por si mesmo nem é sozinho,
A vida não cessa,
Transforma-se...

De tudo o que acontece à nossa volta,
Quase nada percebemos,
E pouco nos interessa.

Ignorantes,
Indiferentes à essência das coisas,
Às aparências
Nos acostumamos.

Desperdiçamos a maravilha
Que é fazer parte
Desse enigma impressionante.

Há muito que perdemos o olhar da infância
- O encantamento do menino Diego (de Galeano)
ao ver o mar pela primeira vez -
Nos reduzimos ao cotidiano,
Às banalidades,
Ao insignificante.

O tempo que sobre a terra nos foi concedido”,
Patéticos, gastamos a explorar estandes,
A percorrer prateleiras
De supermercados,
Vitrines de lojas elegantes.

Esvaíram-se nossas manhãs,
Sem ternura,
Sem amor,
Sem semeadura
(Como dizia Drummond).

O solo, deixamos árido,
A amizade, desprezamos.
Nossa energia
Esbanjamos chorando.

Tempos sombrios” esses dos quais não escapamos.

Assim acreditamos desfrutar a vida:
Praticando o anatocismo alucinante.

Construímos – racionais – os argumentos
Que explicam a fome e a guerra.

(Democracia é um discurso que escrevemos com sangue
ao demarcar nossos domínios sobre a terra).

É bom lembrar (com Milton Santos),
Que a vida humana só é viável nesse planeta
Que é, ao mesmo tempo, nossa morada
E nossa prisão.

E, no entanto, distraídos,
Apenas seguimos o fluxo
Do estúpido progresso que inventamos,
Sem nos perguntar: “Por quê?”
“Pra onde?”

O medo que sofremos se resume
À perda de nosso vil patrimônio.

Nossas crianças já ficaram velhas,
Não há mais sábios,
Não há mais amantes,
Mas – pobres de nós! – ainda temos
Automóveis,
Prozac,
Lipoaspiração,
Viagra,
Anfetaminas,
Diamantes...

Porque queremos cada vez mais do que temos,
Não temos tempo de saber porquê queremos
E nem sabemos, na verdade, o quê queremos.

Um dia, fantasmas, partiremos...
Corpúsculos, seremos dissolvidos
E separados
 – Partículas que somos –
Do todo a que um dia pertencemos,
Do “ser” que jamais compreendemos.

Em nossa curta,
Imprecisa existência,
Desprezível fração de segundos,
Simples piscar de olhos no universo,
Nunca soubemos
Que o observador
Estava dentro de nós mesmos.





Brasília, 24 de agosto de 2006

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

....................... tristeza .............................



Eu não sou essa pessoa triste que você vê.

Eu não sou essa

Triste

Que passou
E você nem viu
Nem notou

De tão triste
Que eu sou...


Dentro de mim
Mora uma morena
Linda
Cor de jambo
De olhos esmeralda
Que sabe fazer
Cocada branca
Cocada preta

Que sai por aí

Sorrindo

Rebolando...







Beatriz Vargas Ramos, Brasília – maio de 2005